Tânia Pedrosa recorda trajetória e fala da beleza da arte naïf
Artista foi homenageada com a Comenda Lêdo Ivo na Assembleia Legislativa de Alagoas
Por Thauane Rodrigues* | Edição do dia 15/04/2023 - Matéria atualizada em 17/04/2023 às 14h37
Traduzida do francês como “arte ingênua”, repleta de autenticidade e cores, a arte naïf é tudo, menos ingênua. Sem parâmetros acadêmicos e produzida geralmente por artistas autodidatas, a arte naïf conquista os olhos dos adoradores pela simplicidade carregada de cultura e afeto.
Expressiva, em todo o mundo é possível encontrar referências e destaques do estilo artístico. Tendo suas primeiras aparições no Salon des Independents [Salão dos Independentes], de 1886, em Paris, a partir da exposição de trabalhos de Henri Rousseau, aos poucos foi ganhando força e se tornando potente, tanto que hoje o Museu de Arte Moderna de Paris dedica uma de suas salas exclusivamente à produção naïf.
Em Alagoas, um dos ícones da naïf é Tânia Pedrosa. Artista, colecionadora e admiradora da cultura alagoana, com olhos atentos e talento nato, Tânia demorou alguns anos para perceber a dimensão de sua arte.
Filha da professora de piano Benita Mathilde de Maya Pedrosa, Tânia cresceu observando as nuances do mundo das artes, mas só na década de 1980, depois de já iniciar sua trajetória como colecionadora, decidiu arriscar pintar algumas telas.
“Eu pintava e escondia, guardei minhas telas durante anos em um quartinho de minha casa. Até que uns amigos descobriram e conheceram minhas obras, logo depois, em 1998, veio o reconhecimento do meu trabalho, o Prêmio Aquisição, da Bienal Naïfs do Brasil, realizada pelo Sesc São Paulo”, contou ela.
Tânia relembra que relutou bastante para ir receber o prêmio, por muito pouco não desistiu, pois afirmava que pintava apenas para ela, por diversão, e que as obras não eram tão boas assim. Aos poucos, foi se acostumando com a nomenclatura de artista e dedicando ainda mais sua vida ao mundo naïf.
Aos 89 anos, a artista coleciona obras, histórias para contar e muita força para seguir pintando e vivendo. Enxergando beleza nas coisas simples e principalmente nas peculiaridades da cultura interiorana e nordestina, as obras de Tânia retratam vivências e afetos.
“Minhas obras são feitas para refletir o Nordeste e, claro, Alagoas, minhas duas coleções mostram sobre Padre Cícero, Lampião, Maria Bonita e tudo que compõe esse cenário. Eu desbravei os sertões, conheci a fundo a cultura, lembro das primeiras vezes que fui à Ilha de Ferro e me apaixonei pelo lugar, em todos os meus quadros têm a presença dela”, contou ela.
Em suas obras é possível reconhecer ícones, cenários e diversas manifestações culturais alagoanas, entre eles estão o Ballet Maria Emília Clark, a Feirinha da Pajuçara, o bairro histórico de Jaraguá e o Pastoril.
A artista segue pintando ativamente e faz questão de divulgar a cultura alagoana através da arte. Sem gostar de vender suas obras, Tânia conta que prefere doar para os museus ou dar de presente, pois acredita que a arte deve ser para todos.
Entre pesquisas e produções, cada obra feita por ela retrata de forma colorida e autêntica tudo aquilo que um dia já foram capturados pelo olhar atento. “Tudo precisa ser feito com interesse, sentimento e imaginação. Sem isso, minhas obras não seriam as mesmas. Eu entrei em muitas casas no sertão e lá encontrei as mais diversas manifestações artísticas”.
Recentemente, a artista recebeu a Comenda Lêdo Ivo, na Assembleia Legislativa de Alagoas. Emocionada com a homenagem, Tânia revela que foi um dos momentos marcantes de sua vida e fez questão de ter os amigos artistas presentes.
“Quando recebi a notícia, fiz questão de que os meus amigos estivessem presente durante a homenagem. Fiquei muito honrada, um momento único e estou muito feliz até porque Lêdo Ivo era meu amigo”, contou ela.
Com tantas obras suas e de artistas diversos guardadas com zelo e carinho dentro de casa, Tânia sonha em levar tudo para um espaço só e transformar em um grande museu.
“Tenho obras valiosas, de artistas que não estão mais vivos, espero ainda em vida realizar o sonho de colocar tudo em um museu para que o povo tenha acesso, a arte deve ser democratizada. Caso não consiga, espero que meus filhos ou netos façam isso por mim”.
*Sob supervisão da editoria de Cultura