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MÚSICA

Gilberto Gil tem pelo menos 20 músicas perdidas em mais de 60 anos de carreira

Grupo de canções tem letra preservada, mas baiano esqueceu ou perdeu a melodia delas ao longo das décadas

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Vasta obra de Gilberto Gil conta com músicas 'perdidas'
Vasta obra de Gilberto Gil conta com músicas 'perdidas' | Foto: Giovanni Bianco/Divulgação

A obra de Gilberto Gil se conta às centenas. Até a última compilação, de 2022, no livro "Todas as Letras", organizado por Carlos Rennó, o número de letras que ele compôs já passava dos 550. Um conjunto de canções que cobre mais de 60 anos de produção, numa obra que é amorosa, mística, solar, futurista, contemplativa e desbragadamente brasileira.

Mas, nessas décadas de carreira, há um conjunto curioso de músicas, um grupo de 20 letras que estão preservadas, mas cuja melodia o músico esqueceu — embora tenha certeza de que chegou a compor pelo menos a maior parte delas. São as canções perdidas de Gilberto Gil.

São em maioria composições da juventude, mas há exemplos até 2009. E metade do total é de 1962, o ano em que Gil estreou na música, com um compacto lançado pela JS Discos, de Salvador.

Letrista e jornalista, Rennó, que realizou mais de 108 horas de entrevistas com Gil, hoje com 82 anos, para o livro com as letras, se lembra de quando começou a se deparar com essas canções. A primeira editora musical do baiano, a Arlequim, costumava publicar revistas com letras dos compositores de seu catálogo.

"Foram nessas revistas que encontrei a primeira série de canções inéditas, de 1962, das quais só restaram os versos. Mas isso me permitiu conhecer as primeiras canções dele, com uma poética meio passadista, na comparação com o tropicalismo, versos parnasianos, mas já bem-feitos", diz Rennó.

Nessas canções, Gil expressa uma visão romântica, quase ingênua do amor - dando claros sinais de sua juventude à época, ainda longe do artista que mais tarde escreveria "Drão" ou "O Linho e a Linha".

Algumas podem ser mais singelas, como "Dó-Ré-Mi": "Dó dó dorme, meu bem/ Ré ré recoste o rostinho/ Mi mi minh’alma te embala/ Fá fá falando baixinho. E outras já mostram o talento para imagens de impacto poético, como "O Beija-Flor": "Tive um sonho com você, amor/ Numa noite sem igual/ E me transformei num beija-flor/ Dentro de um roseiral".

Já outras das canções perdidas ficaram nos vários cadernos que Gil guarda em seu arquivo.

"As perdidas dos anos 1970 encontrei nesses cadernos. Ele sabia que tinha feito músicas para aquelas letras, mas não se lembrava delas. Acho que a maconha já tinha feito seus efeitos", afirma Rennó, rindo. Segundo ele, há letras nesses cadernos não finalizadas e que, por isso, não foram para o livro.

Entre as músicas perdidas, há inclusive canções de ninar que Gil compôs, como esta que parece ter sido composta para Moreno Veloso, em 1975: "Moreno está com roupa de gatinho hoje/ Moreno está tão bonitinho". Ou uma semelhante, que fez para as filhas Preta e Maria Gil: "Dorme, Pretinha/ sonha com os anjos do céu/ e nada mais".

Também aparecem na lista algumas que expressam a espiritualidade de Gil, algo fortemente presente em sua obra, com facetas que vão do misticismo oriental ao candomblé, passando pelo rastafarianismo. Na bela "Rastafarian", de 1976, o tropicalista escreve: "Jah diz:/ ‘Sou Deus, sou bom, sou jamaicandomblé’".

Há dois exemplos de canções que, embora Gil tenha esquecido a melodia, foram musicadas já nos anos 2000. É o caso de "Plateia", de 1983, que o baiano enviou para Maria Bethânia - mas a cantora acabou não usando a música e tampouco guardou qualquer fita com a gravação.

Em 2017, o cantor paulista Danilo Penteado pediu autorização a Gil para criar uma melodia e recebeu sinal verde. Penteado ainda faria música, em 2021, para "Hoje o Dia Nasceu Diferente 2", outra canção órfã de melodia.

"Gil tem letras sensacionais que estão sem música", diz Rennó, que ainda levanta a hipótese de haver cadernos de composições que se perderam.

Quem quiser se aventurar em outro lado menos conhecido da música de Gil não precisa nem apelar a essas canções perdidas. Na pesquisa de Rennó, há ainda quase 20 canções inéditas - o que significa que não foram lançadas em disco, mas podem ter aparecido em filmes, programas de TV ou até em peças de publicidade. Uma prova de que, em uma obra tão ampla, é sempre possível percorrer caminhos diferentes e chegar a cantinhos nunca antes descobertos.

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