CRIMES EM EXPANSÃO
Facções diversificam negócios em Alagoas para lavagem de dinheiro
No estado, pelo menos um posto de combustível é alvo de investigação da PF; mercado imobiliário e depósitos de bebidas também são usados para o crime


As facções criminosas diversificam modelos de negócios e expandem a atuação em Alagoas para lavagem de dinheiro, que vão desde a aquisição de imóveis à compra de cavalos de raça, joias, embarcações e depósitos de bebidas. Mais recentemente essas organizações podem ter encontrado um “novo mercado” no estado: os postos de combustíveis. Isso é o que aponta o Ministério da Justiça, que solicitou investigação da Polícia Federal, sobre a ocorrência de casos assim na maioria dos estados brasileiros.
Em Alagoas, autoridades da Polícia Civil e do Ministério Público Estadual (do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado – Gaecco) dizem desconhecer que postos de combustíveis são alvos de organizações criminosas para a lavagem de dinheiro, mas reconhecem que esses criminosos não têm limites. Esse seria um setor de difícil rastreamento e muito faturamento. Do jeito que as facções gostam.
Outro ramo preferido desses criminosos é o mercado imobiliário. Nesse caso, existe a possibilidade de pagamento em dinheiro, o que dificulta a rastreabilidade pelos órgãos de fiscalização e investigação.
Esses imóveis normalmente se valorizam com o tempo e há a possibilidade de utilização de intermediários (os famosos “laranjas”), além da possibilidade de aquisições e vendas de imóveis com valores muito acima (supervalorização) ou muito abaixo (subvalorização) dos valores de mercado. Isso permite a transferência de grandes quantidades de dinheiro de forma disfarçada.
Além disso, muitos imóveis não são registrados nos órgãos públicos competentes, exatamente para se dificultar o rastreio das transações e, consequentemente, das investigações. É muito comum a compra e a venda de imóveis apenas por meio de contratos de compra e venda sem qualquer tipo de registro público (os chamados “contratos de gaveta”). Em Alagoas, a Polícia Civil já identificou esse mecanismo, como esclareceu o delegado Gustavo Henrique, chefe de Inteligência Integrada da Secretaria de Segurança Pública de Alagoas (SSP/AL).
Mecanismos diversos
Segundo informações da Polícia Civil, outros mecanismos comuns e que também foram identificados em Alagoas são a aquisição de chácaras, gado, cavalos de raça, joias e embarcações, normalmente adquiridos em nome de “laranjas”. Outra técnica comum já revelada são negócios de fachada, como lojas de roupas e depósitos de bebidas.
Outro meio de avançar no crime organizado já constatado em Alagoas é a técnica conhecida como “smurfing”, expressão usada para evitar a detecção de grandes quantias de dinheiro ilícito, fragmentando-as em várias transações com valores menores, de acordo com Gustavo Henrique, cujo objetivo é driblar os mecanismos de controle e monitoramento financeiro, como os sistemas de alerta de transações suspeitas das instituições.
“É comum também as várias transações serem para pessoas diversas. Geralmente na lavagem de capitais não é comum se utilizar apenas um mecanismo (ou tipologia), mas sim haver a combinação de vários, tudo com a finalidade de criar esquemas complexos, tornando o mais difícil possível a identificação da origem (ilícita) do dinheiro”, finalizou o chefe de Inteligência da SSP/AL.
Facções querem faturamento alto
O delegado José Carlos Santos, coordenador da Divisão Especial de Combate à Corrupção (Decoor), enfatiza que de maneira geral os criminosos costumam a utilizar de fato negócios mais difíceis de ter um controle, um exemplo é a agropecuária. Nesse caso a criação de animais, que tem o controle muito complexo.
“Tem essa questão de posto de combustível porque posto é algo muito volátil que entra e sai, tem um faturamento alto embora o lucro não seja tão elevado, pois vendem muito e ganham no volume. E como o faturamento é alto é propício para lavagem de dinheiro”, destaca o delegado.
José Carlos continua que criminosos têm usado outros negócios, como os depósitos de bebidas, porque não precisam de grande estrutura física para montar, não precisa de muitos funcionários para fazer a fachada de empresa e são tipos que o faturamento acaba sendo alto. Ele diz que tem notado que os criminosos estão abrindo empresas que realmente funcionam e estão ganhando dinheiro naquele ramo de atividade.
“Só que além de ganhar dinheiro, estão lavando dinheiro de outras fontes. Eles também atuam para que aqueles negócios deem lucros e, evidentemente, eles matam dois coelhos com uma cajadada só, passam a ter um negócio que têm lucro, bom movimento. Têm duas funções, dar retorno, mas também servir para a lavagem de dinheiro”, conclui.
Infiltrados no crime
Reportagem da Folha este mês deste trouxe detalhes sobre a infiltração do crime organizado em 941 postos de combustíveis de pelo menos 22 estados. O recordista é São Paulo, 290; já Alagoas teria um estabelecimento listado, comandado por facção criminosa, para a lavagem de dinheiro do crime.
No Nordeste, na sequência, estão distribuídos dessa forma os postos de combustíveis utilizados para a lavagem de dinheiro: Bahia (103), Rio Grande do Norte (88), Piauí (25), Maranhão (13), Pernambuco (11), Paraíba (9), Ceará (dois), Alagoas (um) e Sergipe (nenhum).
Sobre a investigação da suposta lavagem de dinheiro do crime organizado envolvendo postos de combustíveis em Alagoas, o promotor de Justiça Napoleão Amaral Franco, coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaecco), disse que o Gaeco ainda não tomou conhecimento formal do caso.
“Existem outros procedimentos de lavagem de dinheiro provenientes do crime organizado instaurados no Gaeco, mas que não se referem a postos de combustíveis”, esclarece.
Em nota, o Sindicombustíveis/AL informou que até o presente momento acompanha pela imprensa as informações referentes a possível infiltração de organizações criminosas no setor de combustíveis, conforme divulgado em reportagem nacional. “Reiteramos nosso compromisso com a defesa dos legítimos interesses dos revendedores de combustíveis que atuam dentro da lei em Alagoas”, diz.
A Gazeta fez contato com o Ministério da Justiça e a Polícia Federal em busca de informações sobre o fato de Alagoas estar na lista de estados que tiveram posto de combustível adquirido para a lavagem de dinheiro, mas não obteve resposta.