São Paulo, SP – A fala do ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre a continuidade do dólar em alta levou a cotação da moeda a subir 0,61%, a R$ 4,2410 nesta terça-feira (26), novo recorde nominal do dólar desde o Plano Real.
A declaração sobre o câmbio também dividiu opiniões no mercado financeiro. Alguns acreditam que ela foi proposital, outros creem que foi apenas uma fala infeliz.
“O dólar está alto. Qual o problema? Zero. Nem inflação ele [dólar alto] está causando. Vamos exportar um pouco mais e importar um pouco menos. É bom se acostumar com juros mais baixos por um bom tempo e com o câmbio mais alto por um bom tempo”, declarou Paulo Guedes na segunda-feira (25) à noite em Washington, nos Estados Unidos. Com a fala do ministro, investidores interpretaram que o governo está confortável com o dólar acima de R$ 4,20 e veem espaço para a cotação subir mais, apostando na alta, o que eleva o valor da moeda. No dia seguinte à declaração de Guedes, o dólar abriu em alta, indo de R$ 4,2150 na véspera para R$ 4,2510. Por volta das 11h, quando o dólar beirava os R$ 4,27, o Banco Central interveio e ofertou dólares à vista. A cotação reagiu, arrefecendo a alta, mas logo retomou fôlego. Às 14h54, o dólar chegou a uma nova máxima nominal intraday (durante o pregão), a R$ 4,277, alta de 1,2%. O pico culminou em novo leilão de dólares à vista, às 15h30, o que reduziu a alta da moeda a R$ 4,254, segundo cotação da CMA. “Foi péssima a fala do Guedes. O dólar já estava alto ontem e hoje, com a fala dele, subiu mais. Pode ser que o ele queria dizer que a moeda ficará em R$ 4,20, mas ele não deveria ter falado o que disse, parece que está jogando contra o país”, conta Mauriciano Cavalcante, gerente de câmbio da Ourominas. Dentre emergentes, o real foi a quarta moeda que mais se desvalorizou na sessão, atrás dos pesos colombiano, chileno e argentino. O movimento cambial refletiu na Bolsa brasileira, que caiu 1,26%, a 107.059 pontos. No exterior, o viés foi misto, com índices da Bolsa de Nova York e das Bolsas europeias estáveis e da América Latina em queda. “Guedes não falou nada de absurdo sobe juros e dólar, ele retratou a realidade. Com o diferencial de taxa de juros de Brasil e Estados Unidos baixa, é normal que o dólar suba. Com a fala, o mercado interpreta que ele está contente com o dólar nesse patamar”, diz Alan Ghani, professor de economia na escola de negócios St. Paul. Para Fabrizio Velloni, chefe da mesa de câmbio e sócio da Frente Corretora, a fala de Guedes sobre o câmbio foi proposital, tendo em vista a divulgação, mais cedo na segunda, do déficit em transações correntes de US$ 7,9 bilhões (R$ 33,3 bilhões) em outubro, pior resultado para o mês desde 2014. “Ele não é inexperiente para falar algo assim sem saber que vai impactar o mercado. Ontem o anúncio de déficit corrente sinalizou um risco às contas, que pode ser revertido com real desvalorizado e mais exportações”, diz Velolloni. “Não acho que tenha sido proposital. Ele foi infeliz na fala dele. Queria dizer que estava tudo bem, mas causou stress no mercado e piorou a situação. A fala sobre o AI-5 também pesou, gerando instabilidade política com reações de Toffoli e Maia”, afirma Fernanda Consorte, economista-chefe do Banco Ourinvest. Além de comentar sobre juros e dólar, o ministro da Economia disse que o AI-5 poderia voltar em resposta a possíveis protestos da oposição nas ruas. “Sejam responsáveis, pratiquem a democracia. Ou democracia é só quando o seu lado ganha? Quando o outro lado ganha, com dez meses você já chama todo mundo para quebrar a rua? Que responsabilidade é essa? Não se assustem então se alguém pedir o AI-5. Já não aconteceu uma vez? Ou foi diferente? Levando o povo para a rua para quebrar tudo. Isso é estúpido, é burro, não está à altura da nossa tradição democrática”, disse Guedes em Washington.