A promulgação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) das Domésticas completa dez anos este ano. No entanto, dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), apontam que apenas 23% destes profissionais em Alagoas possuem carteira assinada. São 69 mil trabalhadores domésticos em Alagoas, sendo 53 mil sem carteira assinada e 16 mil com emprego formal. A emenda constitucional 72, que ficou conhecida como a PEC das Domésticas, foi promulgada no dia 2 de abril de 2013. O objetivo foi assegurar direitos trabalhistas para profissionais do setor, aproximando-o de outras profissões. Em 2015, a lei passou por uma regulamentação que ampliou as garantias previstas para a categoria. O problema, dizem analistas, é que de lá para cá o Brasil mergulhou em um período de baixo desempenho econômico, marcado por duas grandes crises: a recessão encerrada em 2016 e a pandemia de coronavírus a partir de 2020. O contexto de dificuldades travou o avanço da formalização e da renda em diferentes segmentos. As domésticas não ficaram imunes a esse contexto. “A conjuntura macroeconômica acabou se sobrepondo aos efeitos da PEC”, afirma o economista Bruno Imaizumi, da LCA Consultores. De acordo com a Pnad, o Brasil tinha quase 5,9 milhões de trabalhadores domésticos no trimestre encerrado em janeiro de 2023. O número ficou em torno de 2% abaixo de igual período de 2013 (6 milhões), antes da PEC. A parcela na informalidade aumentou. Até janeiro deste ano, 4,4 milhões atuavam sem carteira assinada, o equivalente a 74,8% do total –ou a 3 de cada 4. No início de 2013, o grupo sem o registro era composto por 4,1 milhões (68,4% do total).
A parcela com carteira, por outro lado, encolheu na comparação da década. No trimestre até janeiro de 2023, o contingente de formais foi de quase 1,5 milhão (25,2% do total). No início de 2013, era de 1,9 milhão (31,6% do total). “As duas crises dessa década provocaram perda de renda para as classes média e alta, que são aquelas que contratam trabalhadores domésticos”, frisa Imaizumi. Para a economista Juliana Inhasz, professora do Insper, os dados mostram que o efeito desejado com a PEC não foi alcançado. “O que vemos é uma classe que permanece na informalidade. A PEC não conseguiu impactar a formalização”, aponta. Historicamente, os trabalhadores domésticos têm remuneração inferior a outros grupos pesquisados pelo IBGE e contam com uma participação maior das mulheres. A renda média da categoria foi estimada em R$ 1.087 no trimestre até janeiro de 2023. O valor corresponde a um avanço real (descontada a inflação) de 6%, ou R$ 62, ante igual período de 2013 (R$ 1.025). Na visão de Inhasz, o ganho foi “pequeno”. “É uma classe que sente a qualificação mais baixa. São pessoas que acabam tendo menor poder de negociação salarial”, avalia a professora.
Considerando apenas os trabalhadores domésticos sem carteira assinada, a renda ainda continua abaixo de R$ 1.000. O rendimento médio dessa camada, que é majoritária, foi de R$ 944 no trimestre até janeiro deste ano, 10,4% acima de dez anos antes (R$ 855). Entre os trabalhadores domésticos com carteira, a alta foi de 8,4%. A renda média alcançou R$ 1.511 no trimestre até janeiro de 2023, ante R$ 1.394 de dez anos atrás. O economista Marcelo Neri, diretor do centro de estudos FGV Social, destaca que as crises prejudicaram a vida das domésticas após a aprovação da lei e também dificultaram um mapeamento dos reflexos diretos da medida. “Foi uma década perdida no mercado de trabalho. As empregadas domésticas não estão sozinhas nessa estagnação”, afirma. Neri ressalta que a pandemia empurrou trabalhadoras para a informalidade, já que a crise reduziu a renda das famílias contratantes e causou restrições à mobilidade. É como se a empregada mensalista virasse diarista. Além disso, enquanto a PEC buscou assegurar direitos para as domésticas, a reforma trabalhista de 2017 tentou gerar flexibilidade nas contratações, diz Neri. “Não se sabe como seria sem a PEC, mas houve um aumento na informalidade.” Apesar da alta informalidade, para a professora da UFF (Universidade Federal Fluminense) Hildete de Araújo, referência em estudos sobre o papel das mulheres no mercado de trabalho, a PEC e a regulamentação de 2015 foram importantes, por darem dignidade à categoria.