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Nos bons tempos, a cada começo de ano, tirava trinta dias e viajava com a família por esse Brasil afora, conhecendo lugares, nos divertindo, fazendo, enfim, uma senhora higiene mental. De início, viajava de carro, pois era mais prático, parava onde queria
Por | Edição do dia 21/11/2013 - Matéria atualizada em 21/11/2013 às 00h00
Nos bons tempos, a cada começo de ano, tirava trinta dias e viajava com a família por esse Brasil afora, conhecendo lugares, nos divertindo, fazendo, enfim, uma senhora higiene mental. De início, viajava de carro, pois era mais prático, parava onde queria, conhecia o que interessava, demorava mais em alguns lugares e recomeçava a viagem na hora que nos era mais conveniente. Assim, conheci grande parte desse país. Com o passar do tempo, veio a Guerra do Golfo, encarecendo o combustível. Viajar de carro tornou-se impraticável. Passamos a viajar de avião, com roteiros programados. Nessa época, já havia começado os ataques nas estradas, deixando, muitas vezes, os viajantes com a família na estrada, e, em certas oportunidades, sem dinheiro e sem os pertences pessoais. Mesmo assim, não interrompemos os nossos passeios. Viajamos de Fortaleza até Foz do Iguaçu, passando por todos os outros estados, conhecendo várias cidades que de há muito gostaríamos conhecer. Numa dessas viagens, aportamos em São Paulo, exatamente em 1984, quando da campanha por eleições direitas para presidente e governador de estado. Exatamente no dia 25 de janeiro, ia ter lugar na Praça de Sé o primeiro e grande comício nesse sentido, onde estavam presentes as grandes lideranças democráticas, tais como o grande e inesquecível Tancredo Neves, considerado o maior conciliador, FHC, Mario Covas. Ulysses Guimarães, Dantes de Oliveira, patrono da proposta, e muitos outros. Fomos, então, assistir, pessoalmente ao comício, em meio a uma multidão ávida por democracia e pelo direito de escolher, democraticamente, seus governantes. Iniciado o comício, não conseguia ouvir nada. Resolvemos assistir pela televisão, no apartamento. Foi um dos maiores comícios a que já assisti, belos discursos pronunciados pelos homens que, realmente, pensavam um Brasil grande, livre, democrático, com oportunidades para todos. No dia seguinte, veio a bomba: as forças de repressão tinham inserido policiais na multidão com a finalidade de, subindo nas árvores, cortarem os fios do alto-falantes para o povo não ouvir os bons propósitos e as verdades que estavam represadas. Vejam a que ponto os donos do poder chegaram e, ainda têm a cara de pau de não querer a abertura dos arquivos funestos. É possível que não durmam por um bom tempo. Mas a história de país, por mais triste que seja, precisa ser contada, para que os nossos irmãos que foram torturados e mortos, lá do alto vejam que seu sacrifício não foi em vão.