Civiliza��o selvagem
GILBERTO DE MACEDO * À primeira vista, parece impossível a colocação acima. Mas logo se percebe a possibilidade dessa coexistência contraditória, quando se medita sobre as manifestações da sociedade atual. Civilização diz respeito à constituição da soci
Por | Edição do dia 28/05/2003 - Matéria atualizada em 28/05/2003 às 00h00
GILBERTO DE MACEDO * À primeira vista, parece impossível a colocação acima. Mas logo se percebe a possibilidade dessa coexistência contraditória, quando se medita sobre as manifestações da sociedade atual. Civilização diz respeito à constituição da sociedade, esta entendida como conjunto organizado de indivíduos, segundo determinada estrutura, regida por normas de vida, regras de comportamento e leis de convivência coletiva, em grupo. Trata-se de ajuntamento de pessoas que se estabelecem dentro de espaços físicos, a que se denominam cidades. Assim, quem vive nestas é denominado cidadão, ao qual se atribuem direitos e deveres. A isso chama-se cidadania. É a ordem social regida por leis feitas de acordo com princípios éticos do direito. Leis desobedientes à lógica do direito são formas de corrupção. O direito é mais do que a lei, conforme ensinam os juristas. Se não há obediência ao direito, então prevalecem as leis da selva, isto é a barbárie. Os exemplos estão aí a toda hora, nos noticiários dos meios de comunicação de massa. Selvagem, por sua vez, refere-se, nominalmente, ao homem habitante da selva, numa vida sem ordem coletiva pré-estabelecida que regule as formas de comportamento comum. Cada qual comporta-se conforme entende o momento. É a desordem social. Sem regras e sem leis. Predominam os impulsos individuais. Daí a violência habitual. É o que se chama barbárie. Com o tempo, em face das ameaças dos desequilíbrios periódicos da natureza e a presença dos animais agressivos, os primitivos habitantes foram se aglomerando em grupos, constituindo pequenas comunidades. É o começo da evolução social, criando-se regras de vida, despertando-se para a idéia de valores, visando ao bem-estar de todos. Assim caminha a civilização, cuja meta denomina-se progresso, este apoiado nos ideais de solidariedade e justiça. Como já dizia Victor Hugo. A civilização tem suas frases. Todas, expressão de uma única idéia divina, escrevem, lentamente, a palavra Fraternidade. Mas, o que se vê, hoje, por toda parte? O desrespeito ao direito e suas conseqüências perversas: a injustiça, a violência, a corrupção. Até o Direito Internacional foi posto de lado. Ao invés de missão diplomática aconteceu a omissão diplomática, restaram as armas mortíferas, procedimento equivalente ao dos selvagens. A farsa renegou os princípios democráticos apoiados no Direito, conquista da civilização. Isso nos faz lembrar Ramalho Ortigão, quando diz: A verdade é que a civilização bem como a liberdade, se não decreta. Só há um único meio de as alcançar: merecê-las. E alcançá-las é só pela reconstrução da sociedade, cujo instrumento é a educação cívica para a cidadania. Educação que forme uma verdadeira consciência democrática que acabe de uma vez por todas com essa barbárie moderna. Sejamos, pois, civilizados, lutando por essa conquista da humanidade. Não havemos de desmerecê-la. (*) É MÉDICO