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Nº 5828
Opinião

Chantagem e terror

RONALD MENDONÇA * Há quem exagere e ache que as chantagens e um quê de terrorismo fazem parte do nosso dia-a-dia assumindo formas subliminares – às vezes nem tanto – que olhos bem abertos perceberiam nos pequenos atos do cotidiano. Não seriam, pois, peri

Por | Edição do dia 26/07/2003 - Matéria atualizada em 26/07/2003 às 00h00

RONALD MENDONÇA * Há quem exagere e ache que as chantagens e um quê de terrorismo fazem parte do nosso dia-a-dia assumindo formas subliminares – às vezes nem tanto – que olhos bem abertos perceberiam nos pequenos atos do cotidiano. Não seriam, pois, perigosos bandidos ligados ao narcotráfico ou ao encanecido “sindicato do crime” os autores da maioria das chantagens e, sim, eu, você leitor, os amigos, os vizinhos, a polícia, a Justiça... Sem querer levar para a franca esquizofrenia (sob esse prisma, outros certamente estariam mais aptos a dissecar o tema) o fato é que a nossa cultura é chantagista por excelência. O que nos transmite, por exemplo, a religião? Que carregamos um pecado terrível, “original”, tão execrável que viva o homem bilhões de anos e ainda assim não terá cacife para aliviar sua barra diante do Criador. Acena com o Paraíso após a morte, mas, se não nos comportarmos comme il faut, nos aterrorizam com a perspectiva do Inferno, lugar tenebroso do qual não se sai jamais e de onde só se ouve “choro e ranger de dentes”. A imagem que fica é a de uma larga porta para o inferno, cuja entrada é franca e as vagas são ilimitadas. Já para o céu, os ingressos estariam na mão dos cambistas só restando cadeiras numeradas e caras, além do acesso ser estreito como borboleta de estádio de futebol em dia de clássico. Antes mesmo de o Estado impor as normas ameaçando com multas e reclusões, na casa dos pais o sujeito já aprendeu a conviver com as chantagens bem-intencionadas. Aliás, nas relações familiares, sociais ou quaisquer outras, ninguém é totalmente inocente. Exceção para os políticos que, quando vendem a alma em troca de favores, trocam o termo e falam em “negociação”. Na realidade, voto, poder, amizades, doenças e dissabores diversos, tudo se presta para extrair benefícios, nem que seja o de um olhar. Quanto às nem sempre sutis “chantagens emocionais” é necessário algo mais do que engenho e arte para contorná-las. Nojento mesmo é aquele sujeito que detém um segredo escandaloso e passa a assediar a vítima para se locupletar. Apesar de os exemplos clássicos se referirem ao adultério e ao homossexualismo, outras formas de chantagem podem detonar biografias e governos resultando em algo positivo. (Lembram-se de que o juiz Nicolau “Lalau” foi delatado por um ex-genro?). Por falar em gente graúda, temos aí a acusação – a meu ver inapropriada – de que o Judiciário e o Ministério Público estariam chantageando o governo ao prenunciar “grave crise institucional”, no caso de aprovação de determinados tópicos das reformas da Previdência. Por outro lado, fica a dúvida se o Executivo está fazendo chantagem ou terror quando diz não ter caixa para pagar os aposentados, na eventualidade de as reformas não saírem do jeito que ele quer. (*)É MÉDICO E PROFESSOR DA UFAL

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