Uni�o homossexual
WLADEMIR PAES DE LIRA * No momento em que se comemora a evolução, tanto nas legislações quanto na interpretação do Direito de Família em todo o mundo, inclusive no Brasil, onde vem se prestigiando o afeto como valor jurídico e se quebrando o tradicionali
Por | Edição do dia 14/08/2003 - Matéria atualizada em 14/08/2003 às 00h00
WLADEMIR PAES DE LIRA * No momento em que se comemora a evolução, tanto nas legislações quanto na interpretação do Direito de Família em todo o mundo, inclusive no Brasil, onde vem se prestigiando o afeto como valor jurídico e se quebrando o tradicionalismo preconceituoso da família patriarcal, afastando-se definitivamente o matrimônio formal como o único meio de constituição de família e buscando-se uma solução jurídico-social justa para as relações familiares que se formam através do amor e da convivência, inclusive entre as pessoas do mesmo sexo, vem a igreja católica, na contramão da história, como lhe é peculiar, promovendo uma orquestrada perseguição contra a legalização das uniões homossexuais. A família, antes vista muito mais como instituição patrimonial e política do que como relação de convivência afetiva, sofreu sensível alteração em sua caracterização e no Brasil, especificamente, a grande alteração na conceituação de família se deu com o advento da Constituição Federal de 1988. Nossa Carta Política Vigente afastou o casamento como o único meio reconhecido pela lei para a constituição da família, estabelecendo a proteção do Estado a outras entidades familiares, como a união estável e a família constituída pelo pai ou mãe e sua prole, a chamada monoparental. Embora sejam três as espécies de entidades familiares previstas expressamente no texto constitucional (matrimonial, união estável e monoparental), respeitados doutrinadores, dentre os quais o professor alagoano Paulo Luiz Netto Lôbo, vêm entendendo não se tratar de uma limitação na Constituição (taxatividade), havendo possibilidade de se interpretar a Lei Maior no sentido de que todas as entidades originadas por laços afetivos, com comunhão de vida durante período de tempo incompatível com o relacionamento eventual (estabilidade) e onde os conviventes ou parceiros se apresentam publicamente como integrantes de uma sociedade familiar (ostensibilidade), caracteriza-se uma espécie de entidade familiar que deve merecer a proteção estatal, através de regulamentação específica, incluindo-se, entre outras, a união homossexual. Reconhecer a união homoafetiva, como prefere denominar a desembargadora gaúcha Maria Berenice Dias, como entidade familiar, não significa fomentar a imoralidade, como vem pregando a igreja católica, mas atender à diretriz maior da Carta Constitucional que é a dignidade da pessoa humana, através do respeito à liberdade, à igualdade (sem qualquer discriminação seja de raça, cor, sexo ou orientação sexual), a intimidade e a vida privada. Na Idade Média, a igreja católica perseguiu, torturou e matou pessoas que eram julgadas suspeitas de difundir idéias desvirtuadas dos ensinamentos católicos, em sua maioria mulheres (Inquisição); foi conivente com a escravidão; omissa em relação ao holocausto; contra o reconhecimento da união de pessoas não casadas legalmente e agora propaga uma campanha contra a legalização da união homossexual, GRAÇAS A DEUS, sem a mesma força política que teve em outrora. Difundir os seus parâmetros morais dentro de sua congregação, me parece razoável, sendo possível, inclusive, em função das liberdades de credo e religião, também previstas constitucionalmente. Tentar mobilizar, porém, a sociedade numa campanha extremamente discriminatória, não me parece ser o papel de uma instituição que também tem relevantes serviços prestados em defesa das minorias e dos menos assistidos. O que se busca com a caracterização da união homossexual como entidade familiar e com a legalização dessas uniões, não é transmudar, automaticamente, direitos relativos ao casamento e às uniões estáveis para as relações entre pessoas de mesmo sexo, até porque, são instituições diferentes, mas, sim, garantir um regramento que possibilite aos parceiros de tais relações, sabidamente comuns na nossa sociedade, proteção jurídica relativa às questões previdenciárias, alimentares, patrimoniais, de adoção e de guarda e convivência com os filhos, coibindo os cerceamentos hipócritas e as tão comuns injustiças sociais que ainda hoje se pratica com as pessoas que possuem tendência sexual diferente da maioria. (*) É JUIZ DE DIREITO, TITULAR DA 5ª VARA DE FAMÍLIA DE MACEIÓ, CRISTÃO, HETEROSSEXUAL, CASADO E PAI DE TRÊS FILHOS