O homem do ano
DOM FERNANDO IÓRIO * Manipulados, de certa maneira, já vivemos. Robotizados, ainda não. Fiquei estarrecido quando importante revista concedeu o título de Homem do Ano a um robô que não sente como homem, que não ama como um homem, que não gera com
Por | Edição do dia 19/08/2003 - Matéria atualizada em 19/08/2003 às 00h00
DOM FERNANDO IÓRIO * Manipulados, de certa maneira, já vivemos. Robotizados, ainda não. Fiquei estarrecido quando importante revista concedeu o título de Homem do Ano a um robô que não sente como homem, que não ama como um homem, que não gera como homem. Noticia-se que, no Japão, foi lançado um robô, como manequim. Na Inglaterra, insinuante robô tornou-se apresentador de TV. É por demais impressionante, como se valorizam as coisas, dando-lhes inteligência mecânica computadorizada, sem emoções, nem sentimentos, deixando-se o ser humano com toda a sua história de consciência ética e moral, pisoteado, enjoeirado, desvalorizado. Em um mundo onde se valorizam as coisas, necessitamos de valorizar o ser humano, por causa de quem existem as coisas. O robô não pergunta para emitir juízos, não reclama quando sofre, porque não sofre, não engravida, nem gera. Apenas faz, somente diz o que se programa. O robô reduz-se a simples escravo da Cibernética. Sem vontade própria não se move à procura de ambições. Tornam-no escravo os defensores da liberdade. O verbete robô carrega o significado de trabalho forçado. Impõe-se a TV sobre nossas próprias imagens, roubando-nos projetos e utopias, histórias e sonhos, conduzindo-nos, paulatinamente, ao analfabetismo semântico, no tocante aos significados das coisas e da vida. Aos poucos, estamos sendo robotizados por estruturas frásicas sonoras que fragmentam sintagmas na prolação metálica fechada de nasalização robótica. A penúria lingüística é tamanha na prolação robótica que nos sentimos desprovidos de conteúdo, ameaçados na capacidade de reflexão própria, de consciência crítica. Nossa indignação deve ser constante na luta contra a acomodação ao analfabetismo filosófico que toma conta da sociedade em que vivemos. Qualquer sociedade robotizada é insensível à solidariedade, ao amor. Um professor de informática, certa feita, me confessou: Como trato, com carinho, o meu computador! Mas ele nunca, espontaneamente, me disse: eu te amo. Não é diferente o robô. Mesmo assim, prefiro acender uma luz no meio das trevas, que nos circundam, a proferir lamúrias, maldizendo a escuridão robotizada. (*) É BISPO DE PALMEIRA DOS ÍNDIOS