Crise e soberba
EDUARDO BOMFIM * A fogueira da crise no governo arde em respeitáveis labaredas. Nada tem sido fruto do acaso ou de ações maquiavélicas da oposição em geral. Podemos citar alguns fatos que contribuíram para o de-senvolvimento deste quadro. A manobra casu
Por | Edição do dia 10/05/2002 - Matéria atualizada em 10/05/2002 às 00h00
EDUARDO BOMFIM * A fogueira da crise no governo arde em respeitáveis labaredas. Nada tem sido fruto do acaso ou de ações maquiavélicas da oposição em geral. Podemos citar alguns fatos que contribuíram para o de-senvolvimento deste quadro. A manobra casuística ou golpista, como quiserem, que consolidou a chamada verticalização das coligações. O objetivo central foi enquadrar os partidos situacionistas em torno da candidatura do Planalto e dificultar ao máximo os movimentos das forças de oposição. Seria ingenuidade, também, ignorar o pugilato do governo central contra o ex-presidente do Congresso Nacional, o senador ACM. É do conhecimento geral que o conservador e caudilho baiano não agiu sozinho durante o episódio da violação do painel do Senado Federal. Havia o conhecimento de FHC e a sua aquiescência. Mas ele precisava ser eliminado do jogo. O propósito ficou claro nos desdobramentos posteriores. Logo após e em conseqüência, através de um golpe rápido e fulminante, detonaram irreversivelmente a candidata do PFL em alta nas pesquisas de opinião pública, porque ela atrapalharia consideravelmente o caminho de José Serra ao governo central. Aliás, a verticalização das coligações e a desestabilização de Roseana Sarney foram urdidas, planejadas, quase que simultaneamente. A estratégia dos tucanos apresentava-se, aparentemente, destinada ao sucesso. Com a força da máquina governamental, a grande mídia dócil, o apoio do sistema financeiro internacional, de organizações como o FMI, simpatia sem restrições dos EUA e outros segmentos do grande capital, tudo parecia óbvio e sem perigo de sobressaltos. Esqueceram-se, no entanto, do imenso índice de rejeição popular do governo do presidente sociólogo e, em decorrência, do seu candidato. Além da economia em recessão, estagnação econômica, juros estratosféricos, desemprego, privatizações contrárias aos interesses nacionais e recheadas de denúncias de corrupção, arrocho salarial contra os trabalhadores do setor privado e os servidores públicos em geral. Há uma espécie de arrogância combinada com a sensação de impunidade total e irrestrita. Neste contexto, cresceram as candidaturas dos partidos de oposição e, em particular, a do Lula. Juntas, somam mais de 60% da preferência popular. O resultado foi o desmoronamento da aliança que sustentava o governo FHC, que o elegeu presidente duas vezes consecutivas. O PFL percebeu que estava sendo jogado para o terceiro plano como partido do bloco do governo. O PMDB, dividido, possui dificuldades de indicar o vice na chapa oficial. E mesmo que o faça, as condições de unidades interna são no mínimo duvidosas. Os banqueiros internacionais e nacionais fazem chantagem, com ameaças de choque especulativo, mas a repercussão tem sido, até o momento, insuficiente para provocar uma tensão institucional e cambial no País. Surgem, em decorrência do aprofundamento da crise na base governista, escândalos financeiros pesados envolvendo figuras do alto escalão de FHC, respingando no candidato oficial do sistema. Há uma evidente luta intestina no PSDB como o objetivo, desesperado, de mudar o candidato Serra por outro, na busca de recompor a base aliada situacionista. Creio que a emenda será pior que o soneto. A crise dificilmente será estancada. Enquanto que a situação atual provocará, como desdobramento, uma queda de José Serra nas pesquisas, o crescimento de Lula e outros oposicionistas, muito embora o Planalto disponha de reservas poderosas, lícitas ou ilícitas. O governo e o regime econômico esgotaram-se. Existem indícios de descontrole, e há a possibilidade de surgir no País uma poderosa onda mudancista de conseqüências eleitorais imprevisíveis. Com desdobramento pelos Estados da Federação. (*) É ADVOGADO