Dois dias após deixar a carreira no Ministério Público Estadual (MP), o agora ex-procurador-geral de Justiça, Alfredo Gaspar de Mendonça, falou sobre o futuro como político. Tratado como pré-candidato a prefeito de Maceió, o seu discurso oscila entre o jargão de quem fiscalizou os Poderes com o de quem será “vidraça” no processo eleitoral. Cria do Palácio República dos Palmares, ele desconversou quanto ao desgaste de ter o apoio da gestão do governador Renan Filho (MDB), que já foi alvo de cinco operações da Polícia Federal, mas reforçou que não vai abrir mão do combate à corrupção. Ao mesmo tempo, confirmou que a aproximação com o prefeito Rui Palmeira (sem partido) foi por sugestão sua, por entender que é possível unir até mesmo lideranças divergentes em torno de um projeto maior. Alfredo Gaspar negou que isso seja parte de um “acordão” para as eleições de 2022. Gaspar também se revela um hábil líder de grupos e garantiu que cumprirá seu mandato na íntegra, como fez em outras funções públicas que ocupou.
Gazeta. O que o motivou a deixar uma carreira sólida no Ministério Público Estadual para encarar o desafio de um mandato eletivo?
Alfredo Gaspar. Acho importante destacar que o meu caminho se mantém o mesmo, porque ele é pautado por princípios. E também por ideais. Isso é o que me motiva e tudo o que construí, inclusive no MP e no período da Secretaria Estadual de Segurança Pública, teve esta base. Posso dizer que a minha maior motivação, para cogitar o que chamaria de um passo à frente nesta trajetória, é a vontade e a disposição para fazer mais pelas pessoas. E elas podem esperar de mim o que sempre tiveram: sinceridade, autenticidade, dedicação e determinação. O que me levou a ingressar no Ministério Público, onde defendi e pratiquei o que acredito, a fazer o certo e combater o malfeito, agora me estimula a seguir. Aprendi muito, amadureci, conquistamos muitas vitórias e creio que posso fazer ainda mais.
O que o senhor leva da experiência no MP para a vida política?
Eu me considero um gestor acostumado aos desafios, a liderar equipes, a encontrar soluções, sem jamais temer o enfrentamento dos problemas, com planejamento, ação e obstinação para resolvê-los de verdade. A minha trajetória no Ministério Público e a passagem marcante na Secretaria de Segurança Pública comprovam isso. E registro isso humildemente, porque tudo só foi possível pelo trabalho coletivo, pelo esforço de muita gente. Precisei estar no comando, fui chamado a esta missão, mas a assumi dando os braços a todos os que compartilhavam do mesmo objetivo. Combater a corrupção e o crime não são tarefas simples, mas isso nunca nos imobilizou. Ao contrário, quanto maior a dificuldade, mais forte a nossa disposição. Posso dizer, portanto, que esta experiência e prática me trouxeram ao novo momento. Não venho da política, mas posso entrar nela com uma visão clara do papel a exercer. Minha vida, até aqui, foi dedicada a fazer o bom combate. Sempre fiz isso e vou continuar a fazer, sem concessões, sem qualquer hesitação. Quero fazer parte da solução.
Depois de deixar o MP, o próximo passo para disputar a sucessão municipal é a escolha de um partido. Qual ou quais legendas lhe ofereceram espaço?
A opção partidária faz parte deste processo que se inicia, mas esta escolha não será um elemento definidor. Ou seja, o que define são os meus princípios, como já disse. É a minha história de vida e tudo aquilo em que acredito. Mas, uma vez ingressando em um partido político, trabalharei incansavelmente para que ele seja uma agremiação afinada com as demandas da população. Um partido político precisa ser uma instituição viva, renovável, democrática, só assim terá legitimidade. E eu só farei parte de coletivos onde a minha voz seja ouvida. Eu não me calo e nem me curvo. Participarei de mais uma instituição, neste caso partidária, contribuindo para que ela seja cada vez melhor. E possa cumprir o que lhe cabe.
O senhor vê algum desgaste político em ter o apoio do governador Renan Filho (MDB) após a gestão estadual ter sido alvo de cinco operações da Polícia Federal?
Muitos políticos de carreira e com longa história neste campo sonharam com apoios fortes. E o governador é um exemplo de apoio forte. Se ele, que lidera uma gestão que merece respeito, pelas realizações, que tem um trabalho reconhecido pela população, manifestou simpatia pelo projeto que eu quero defender para Maceió, será bem-vindo. Isso não altera em nada o rumo traçado e a minha forma de pensar e agir. Eu vou preservar a minha autonomia, a minha independência, em qualquer situação. Inclusive continuarei apoiando, de modo firme, a ação das instituições fiscalizadoras. Que toda e qualquer denúncia seja apurada, assegurando, é claro, o direito de defesa. Ninguém está acima da lei. A luta de toda a minha vida é por Justiça. Quero que o Poder Executivo, em qualquer esfera, exerça o seu papel. E acredito que há muitos resultados possíveis, que são incontestáveis, como estamos vendo. Seguirei defendendo e fazendo o certo. Acreditando no aprofundamento da renovação política. Desejo ser parte ativa na construção deste novo tempo.
Isso não pode comprometer o seu discurso de combate à corrupção?
Nada vai comprometer meus valores e princípios, dentre eles o combate a todo e qualquer tipo de corrupção. As pessoas conhecem minha trajetória e minhas ações falam por mim. Tenho uma história escrita numa luta incansável, no combate aos crimes envolvendo corruptos. A propósito, eu sempre enfrentei os riscos decorrentes disso e nada me tirou deste percurso. Não existe qualquer possibilidade de dar algum passo que viesse a comprometer minha consciência e minhas convicções. O meu maior patrimônio é a minha credibilidade. Erguida com posicionamentos e ações concretas. É o que vou levar comigo, por onde for.
E quanto ao apoio do prefeito Rui Palmeira (sem partido)? Foi o senhor quem buscou essa aproximação ou contou com alguma orientação política?
Eu sempre me perguntei: por que a política da convergência não poderia prevalecer sobre a divisão, a intriga, a disputa permanente? Por exemplo, por que não unir Maceió em torno de um projeto? Divididos nós seremos sempre mais fracos. Sabemos que em nada na vida há concordância plena e absoluta, em todas as pautas. Em lugar nenhum isso existe. Mas pode existir uma capacidade madura de buscar a convergência possível, essa é a orientação política que me interessa. E que interessa à maioria da população. Tem gente, pouca gente, que hoje critica este fato novo na nossa política, mas que tentou este apoio, procurou esta aproximação. Fico feliz de ter sido procurado. E de ver este diálogo ganhar contornos tão concretos, com respeito, com transparência, sem rodeios. Acima de tudo devem estar os interesses da cidade, da população.
É verdade que, se esse apoio se consolidar, o senhor irá permitir que Rui indique o vice de sua chapa? Quanto ao DEM, seria a principal ou a melhor opção e por que?
Como já deixei claro, este é um momento de analisar cenários, dialogar, ouvir ideias, escutar a população, sobretudo. E fazer todas as conversas necessárias. Estamos dando início à construção de um projeto, e queremos que a base seja firme, consistente. Apoios, composições, legendas são pautas presentes, que integram essa agenda, mas que não serão precipitadas. Existe uma etapa de amadurecimento. Não vai demorar mais do que é preciso. Mas não haverá precipitação.
É verdade que a construção desse apoio que une em torno do seu nome Renan Filho e Rui Palmeira há uma costura para a eleição de 2022?
Um primeiro ponto a registrar: eu não deixei uma carreira de 24 anos no Ministério Público para entrar no projeto de ninguém. Mas não serei arrogante a ponto de evitar apoios que podem, concretamente, ampliar as condições de realizar o que estou me propondo. Isso diz respeito a este ano. Não se trata de acordo ou “costura”, trata-se de um projeto que tem coerência, propósitos, que abre perspectivas. Tudo a seu tempo. Estou olhando com toda atenção e carinho para a nossa capital.
Uma vez eleito prefeito de Maceió, o senhor pretende cumprir os quatro anos de mandato, ou se estiver bem avaliado daqui há dois anos pode disputar o governo?
Sim, caso esse projeto se transforme em realidade vou cumprir. Em verdade, nunca deixei de cumprir minhas obrigações, seja como membro por 24 anos do Ministério Público, secretário de Segurança Pública ou procurador-geral de Justiça. Sequer oficializei uma pré-candidatura ou mesmo minha filiação partidária. O momento é de maturação para tomar as melhores decisões. E ele aponta claramente para um projeto que contemple Maceió.