Conforme os pequenos e médios empresários da construção civil preteridos pelas licitações em lotes do governo estadual previram, a empresa Verdi Sistema Construtivo Ltda, com sede no Rio Grande Sul, foi a grande vencedora da licitação nº 009/2021, para obras no Regime Diferenciado de Contratação (RDC). O objeto é o sistema de registro de preços visando a futura e eventual contratação de construção de 30 Centros Integrados de Segurança Pública (Cisp) tipo 1, em municípios que serão definidos pela Secretaria de Segurança Pública (SSP). A empresa gaúcha vai faturar R$ 75 milhões em construção de Cisp em regime modular, com paredes de fibra de vidro e madeira prensada. Cada Centro desse - chamado jocosamente de “Cisp de papelão” por conta da fragilidade - tem o metro quadrado mais caro que de imóvel de luxo na área mais valorizada de Maceió, a orla marítima. Os Cisps serão construídos no sistema modular da empresa Verdi. Este modelo RDC praticamente exclui cerca de 100 pequenas e médias construtoras de Alagoas das licitações. Ao contrário do governo estadual, municípios como Maceió e Arapiraca aboliram o sistema RDC e executarão mais de R$ 1,5 milhão em obras públicas que serão construídas em modelos convencionais, para fazer circular o dinheiro público com as empresas alagoanas e garantir a geração de emprego e renda em Maceió e no Agreste. A construção com produtos da Verdi utiliza módulos que, segundo policiais civis, militares, delegados, Sindicato dos Policiais, Associação de Delegados e entidades dos militares, são de baixa qualidade e não resistem à umidade dos períodos invernosos. A empresa gaúcha garante que seus produtos são “de boa qualidade”. O que causa estranhamento nos empresários preteridos pela licitação do governo estadual é a forma como esse resultado foi obtido pela empresa vencedora. Segundo eles, apenas duas empresas participaram da licitação: a própria Verdi e a BWS Construções Ltda., o que reforçaria o caráter restritivo das regras definidas no RDC. A Verdi ofertou o valor de R$ 76.470.000,00, com um desconto de pouco menos de 0,5%. O preço básico estimado pela Secretaria de Estado da Infraestrutura (Seinfra) era de R$ 76.810.956,30. Ou seja, o governo de Alagoas contratará os Cisps ao preço de R$ 10.700,00 por metro quadrado, preço este comparável ao dos endereços mais nobre da beira mar da capital alagoana. Se for considerado o valor do terreno, que não está incluso no valor dos Cisps, o valor do metro quadrado é ainda maior. A empresa BWS, sediada na rua Luiz Moreira Gomes, 11, no Parque Jabuti, em Eusébio (CE), é uma empresa de pequeno porte cujo capital social é de R$ 300.000,00, ou seja, 25 vezes menor do que o exigido na licitação. Isto, em tese, caracterizaria sua total incapacidade econômica para participar deste processo licitatório. Como esperado, a BWS foi desclassificada da licitação, mesmo tendo oferecido a proposta de R$ 56.840.107,50, o que representa um desconto de mais de 25%, cerca de R$ 20 milhões. Com esse sobrepreço, a BWS entregaria mais 20 Cisps ao povo alagoano. Esta situação, de acordo com os empresários, gera suspeita de sobrepreço praticado pela empresa vencedora do certame. A Verdi já ganhou cerca de R$ 142 milhões do governo Renan Filho (MDB): ela foi vencedora em outro processo de RDC, em que somente ela e outra pequena empresa, cujo capital social é de R$ 100.000,00, participaram. Também seguindo o modelo restritivo de licitar por RDC, novamente a Verdi será a vencedora do RDC 007/2021, cujo objeto é a contratação integrada para elaboração de projetos e execução da reforma da penitenciária masculina de segurança máxima com a criação de 308 vagas. Além de reforma do Presídio Feminino Santa Luzia, todos no complexo penitenciário de Maceió. Os empresários preteridos acreditam que a empresa gaúcha vencerá porque somente ela está concorrendo. Diferentemente do RDC 009/2021. Desta vez, as construtoras não poderão indicar o percentual de desconto ofertado pela Verdi, uma vez que o preço básico definido pela Seinfra é “sigiloso”. O processo de licitação do RDC 008/2021, cujo objeto é o Sistema de Registro de Preços visando a futura construção de 80 Unidades Básicas de Saúde (UBS) do tipo 1, para atender as gerências regionais de saúde. Novamente o certame será em lote único, segue tramitando na Comissão Permanente de Licitação (CPL) da Seinfra. Os empresários questionam: Será que mais uma vez teremos uma ou duas concorrentes? Será que mais uma vez a Verdi será a vencedora? Eles não poderão anunciar o desconto oferecido pela vencedora porque, mais uma vez, o preço básico da obra é “sigiloso”.
ARAPIRACA
Na sexta-feira ocorreu a primeira reunião do primeiro processo licitatório das 15 obras de construção de creches e escolas em Arapiraca. Processos individuais, concorrências públicas abertas, sem maiores restrições à participação de pequenas e médias empresas. O resultado: 23 empresas estão concorrendo. O prefeito, em recente pronunciamento, assegurou que as licitações são individuais para que as pequenas e médias empresas tenham condições de participar. Ele quer garantir a geração de empregos na região e retomar o crescimento econômico, já que a construção civil tem este poder. As indústrias de cerâmicas vermelhas de Alagoas sentem os impactos da recessão econômica nacional agravada desde março do ano passado pela pandemia do novo coronavírus. Apesar da construção civil privada não ter paralisado totalmente, das 35 indústrias que existiam no estado, 21 conseguiram se manter com dificuldades. As obras públicas de fim da gestão Renan Filho na saúde, educação, segurança pública e sistema penal, se forem executadas em sistema modular, não contribuirão para a superação da crise no setor. O alerta é do Sindicato das Indústrias de Cerâmica do Estado. O sindicato apoia a defesa dos pequenos e médios construtores alagoanos que querem licitações individuais e obras convencionais para gerar milhares de empregos, a sobrevivência das indústrias locais fornecedoras de produtos para a construção civil e movimentar a economia estadual. Licitação de lotes de obras em RDC praticamente impõe sistema de construção modular, beneficia um seleto grupo de construtoras de grande porte em detrimento de 100 pequenas e médias empreiteiras alagoanas que geram milhares de empregos. Os empresários preteridos dizem que não têm capital social elevado para participar de certames licitatórios e disputar mercado com a empresa Verdi. Por outro lado, os projetos modulares encarecem o custo final da obra em até 95%, não promove a circulação de recursos públicos nas indústrias alagoanas e pode provocar sobrepreço nos projetos, lamentam os empresários. O presidente do Sindicer, Frederico Gondim Carneiro, explicou que com a crise recessiva que começou em 2014, houve quebradeira de empresas e milhares de desempregados em todo o País. Até hoje contabiliza mais de 14 milhões de desempregados. O setor ceramista vermelho sofreu um forte impacto da crise econômica. “Com o surgimento da pandemia a situação piorou. Das 35 indústrias de Alagoas, 14 fecharam. O setor que ofertava 1.700 empregos diretos, demitiu 970 trabalhadores”. Por isso, Gondim acredita que este é o momento de fortalecer a indústria da construção civil. Lembrou que as prefeituras estão executando obras convencionais e fazendo licitações individuais. “Isto gera milhares de empregos e favorece a circulação de dinheiro na economia”, diz. Frederico Gondim considerou como positiva as ações das prefeituras de Maceió, Arapiraca e outras. “As obras convencionais também têm prazo e tecnologia. Por outro lado, fortalecem as indústrias do estado, oferecem mais oportunidade de trabalho e ajudam a fortalecer a economia local”, explicou o empresário que é também um dos diretores da Federação das Indústrias de Alagoas. “Neste momento de retomada da economia precisamos apoiar as empresas de Alagoas”.
LEGISLATIVO
A 6ª Comissão na Assembleia Legislativa (ALE), que investiga licitações e obras públicas do governo estadual, analisará as reclamações dos pequenos e médios empresários da construção civil contra as dezenas de obras de fim de gestão Renan Filho em sistemas modulares vencidos pela empresa Verdi. A informação é de um dos integrantes da comissão, o deputado governista Ronaldo Medeiros (MDB). A maioria dos integrantes da comissão é formada por governistas e integrantes da base de sustentação do governo no Legislativo. O presidente é o deputado Bruno Toledo (Pros), vice Leo Loureiro (PP), Antônio Albuquerque (PTB), Cibele Moura (PSDB)e Ronaldo Medeiros (MDB). O vice-presidente da comissão defende que a apuração de suposta irregularidade, se houver, tem que ser formalizada. Do contrário, não há o que se investigar. “Até o momento não tem nenhuma denúncia formal dos empreiteiros que se sintam preteridos pelas obras que o governo pretende executar”. Com relação às reclamações dos empreiteiros, o deputado Ronaldo Medeiros disse que “só estão fazendo denúncias porque tem muitas obras em andamento em Alagoas. Mas vamos apurar e no final vamos constatar que as denúncias são vazias. A mesma coisa fizeram com o ex-presidente Lula e agora ele está sendo inocentado em todas as acusações”, compara.
MINISTÉRIO PÚBLICO
Atualmente, uma das promotorias da Fazenda Pública Estadual do Ministério Público de Alagoas investiga o caso. Quer saber, por exemplo, quem vai bancar as obras de fim do governo Renan Filho. Um ofício neste sentido já foi encaminhado ao Executivo estadual. O MP adotou o procedimento para saber se os recursos para as obras são do governo federal ou do Tesouro Estadual e detalhes do modelo licitatório. Os editais de licitação divulgados pelo governo não definem de onde vêm os recursos para tantas obras de fim de governo.