A pressa e as mudanças feitas na reforma eleitoral da eleição passada, denominada “minirreforma”, devem provocar retrocessos nas regras do próximo pleito. Isso porque há possibilidade da redução do número de candidatas mulheres, por causa de alteração na cota de representação, de raça, além do “perdão” para as legendas que não prestaram contas e estão em débito com a Justiça Eleitoral.
A outra mudança significativa e que havia sido prevista, ainda na Lei da Ficha Limpa, é questão da punição dos candidatos considerados inelegíveis. Anteriormente, logo no julgamento da primeira instância a pena de oito anos já se iniciava de imediato. Isso independentemente dos recursos que os condenados impetrassem na Justiça. Agora, a pena só começa a valer após todos os recursos, com matéria transitada em julgado.
Na prática, com a morosidade do Judiciário, recursos protelatórios dos advogados de defesa, haverá situações em que o político, mesmo tendo sido condenado em primeira instância, dispute um novo pleito, se eleja, até volte a cometer irregularidades, enquanto a pena pela sua primeira punição não seja cumprida.
A matéria tramitou em tempo recorde, em menos de um mês nas comissões temáticas da Câmara dos Deputados. Outro fato que chamou a atenção desde o início é que contou com o apoio de partidos de esquerda, centro e direita, sem grandes contestações. Isso tanto na análise técnica como na votação em plenário. Foram 367 votos a favor do texto e apenas 86 contrários.
A pressa é para que as novas regras possam valer já para a eleição de 6 de outubro. Assim, outra mudança como a subcontratação sem a prestação de contas de quem recebeu o dinheiro, também podem ocorrer. Elas podem ser contratadas por empresas terceirizadas e prestadoras de serviços na campanha. Sendo assim, o “risco” para a compra de votos é real.
Outra mudança envolve a falta de transparência sobre os doadores. É que poderão realizar doações via PIX, por meio de chaves que não constem o CPF, com os candidatos tendo até 72h para demonstrar de onde veio o recurso. A preocupação é que a grana venha de empresas, o que ficou proibido há dois pleitos.
FAVORECIMENTO
Com tantas alterações, a cientista política e professora da Ufal Luciana Santana não tem dúvidas de que está sendo proposto é mesmo algo para fomentar maiores facilidades dos partidos em conseguir cumprir as regras. Até porque, até hoje, ainda há legendas com pendências, candidatos enfrentando punições e com possibilidades de não disputarem a próxima eleição. Mas tudo isso com base no texto em vigor.
“O que temos percebido é que muitas mudanças, especialmente no sistema eleitoral, são contextuais. Muito para atender a interesses dos políticos e dos partidos. Não é diferente nessa minirreforma. É algo preocupante porque tivermos uma reforma recente e não teve ainda nem tempo de verificar se essas medidas terão o efeito esperado”, analisou Luciana.
Ela lembra que a própria construção da lei em vigor contou não somente com o tempo necessário, mas também com a pressão social que é importante para apontar caminhos, já que a própria Lei da Ficha Limpa foi reflexo de uma grande mobilização nacional. E o seu conteúdo acabou influenciando outras mudanças necessárias naquela oportunidade em que a sociedade estava preocupada com a qualidade dos políticos que seriam eleitos.
“Isso acaba nos levando a entender que as mudanças apresentadas estão ali para acomodar os interesses dos partidos e dos políticos. Ou seja, estão pensando muito mais na sua ambição política. Sou crítica da forma que foi feita, em tempo recorde e também pelo conteúdo”, completou a cientista.
O próprio contexto político em que as propostas de alteração foram analisadas chama a atenção. Isso porque o País acompanha o julgamento dos envolvidos nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro, que pretendiam forçar a intervenção militar. Por conta da repercussão do caso, o próprio noticiário repercurte com maior tempo detalhes dos julgamento e dos ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), em relação aos detalhes da minireforma.
Outro ponto interessante é que, como ela ainda será analisada pelo Senado e nem todos sabem do rito que isso representa, sugere que é algo que pode demorar. Mas tudo indica que não é o que ocorrerá. Isso porque a maioria dos partidos com representação na Casa também é favorável às mudanças. Caso mexam no texto aprovado, ele retorna para a Câmara para nova apreciação.