Lagoa da Anta
Pernambucanas e Record têm contrato para construção de espigões
Com negócio fechado, empresas estariam tentando ludibriar MPE; ambientalistas alertam para danos

A Lojas Pernambucanas (proprietária do Hotel Jatiúca) e a construtora Record celebraram um contrato multimilionário para a construção de espigões onde, há mais de 40 anos, funciona o resort pé na areia que convive harmonicamente com o ecossistema único que a Lagoa da Anta presenteia à população de Maceió. O chamado ‘contrato de gaveta’ prevê o início das obras após o período eleitoral.
A informação foi obtida pela Gazeta junto a executivos que participaram de reunião entre representantes da Pernambucanas e da construtora. A iniciativa ignora o entendimento do Ministério Público Estadual, que vê no projeto uma descaracterização da da paisagem característica da cidade.
Para entender como será o projeto e o impacto ambiental e urbanístico para toda a região, a Gazeta entrou em contato com o CEO das Lojas Pernambucanas, Marcelo Labuto. Confrontado com a informação sobre a existência do contrato que pode acabar com o cartão-postal de Maceió, o executivo, pego de surpresa, disse que não poderia responder porque estava em uma reunião do conselho, mas que retornaria em seguida, o que não fez.
Após 17 ligações da reportagem por dias consecutivos e uma série de tentativas de contato pelo WhatsApp, Labuto se limitou a dizer que a resposta sobre a venda do hotel seria dada pela assessoria de imprensa. “A Pernambucanas informa que, no momento, não irá se posicionar sobre a pauta em questão”, comunicou a empresa.
Ambientalistas ouvidos alertam que o cenário bucólico que reúne lagoa e mar, com sombra, coqueirais, grama verde e muita tranquilidade, em plena capital, pode estar perto do fim.
O entorno do Hotel Jatiúca, que reúne nas manhãs e fins de tarde famílias e pets, deve ser radicalmente transformado com a construção de cinco torres de apartamentos após a venda do resort.
A paisagem do “coração da Jatiúca” que, há quase 45 anos, marcou a identidade daquela parte da cidade, vai ser privatizada.
Outro ponto destacado pelos especialistas é a ausência de discussão sobre o tema em virtude do irreversível dano ambiental.
A Lagoa da Anta, com sua paisagem integrada ao hotel, tornou-se um dos espaços mais importantes de convivência na orla da Jatiúca. Seja pela tranquilidade, seja pelo equilíbrio com a natureza, o local foi cuidadosamente projetado pela equipe do paisagista Roberto Burle Marx.
SILÊNCIO TOMA CONTA DO PROJETO
O diretor do Hotel Jatiúca, Bruno Pizzoni, afirmou, por ligação telefônica, que não tem autorização para falar sobre o assunto e que só poderia comentar por meio da assessoria de imprensa.
A construtora Record não respondeu aos questionamentos, tanto por ligação quanto por mensagem, por meio dos seus representantes Hélio Abreu, que é sócio, e Fernando Theodomiro, assessor de comunicação da empresa.
Sobre o pedido de licenciamento ambiental para a obra, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (Semurb) informou que não há novas solicitações, apenas para prorrogação do funcionamento do Hotel Jatiúca. A Record deve dar entrada na solicitação após o período eleitoral.
MP DISSE ESTAR VIGILANTE
A construção dos espigões no entorno da Lagoa da Anta vai de encontro ao entendimento do Ministério Público Estadual, que é contra o projeto por causa dos danos ao meio ambiente. O promotor Jorge Dória chegou a iniciar uma investigação do caso.
O órgão ministerial pediu explicações, uma vez que os danos ambientais e urbanísticos do novo projeto seriam difíceis de mensurar e com danos incalculáveis para a lagoa da anta e toda diversidade, além da restrição no fluxo de pessoas que hoje coabitam harmonicamente com a região.
O processo, entretanto, foi arquivado após as empresas envolvidas supostamente terem desistido da iniciativa.
Na semana passada, o promotor Jorge Dória disse que seguia vigilante para caso a possibilidade ressurgisse e que não permitirá que a paisagem característica da cidade seja desconfigurada.
“Esse procedimento foi arquivado em função da inexistência de medidas efetivas de transformação da área. Caso esse assunto volte à tona, ou de alguma forma venha se falar, ou se alguma ação efetiva venha a ser tomada nesse sentido, o Ministério Público tomará as providências no sentido de proteger aquela paisagem, uma vez que seria inadequado e irregular [um projeto imobiliário]”, explicou.